O Nepal enfrenta nesta semana a pior crise política e social desde o fim da monarquia em 2008. A capital, Katmandu, foi tomada por protestos que se espalharam por todo o país, resultando em incêndios de prédios públicos, invasão do Parlamento, renúncia do primeiro-ministro KP Sharma Oli e dezenas de mortos.
De acordo com o The New York Times e a agência Reuters, os manifestantes incendiaram a casa do ex-primeiro-ministro Jhala Nath Khanal com sua esposa, Ravi Laxmi Chitrakar, dentro do imóvel. Ela sofreu graves queimaduras e foi resgatada pelo Exército, permanecendo hospitalizada.
Estopim da revolta: bloqueio das redes sociais
Os protestos começaram na segunda-feira (8), após o governo anunciar o bloqueio de redes sociais como Facebook e Instagram em todo o país. A justificativa oficial foi que as plataformas não colaboraram com a Justiça nepalesa para combater crimes digitais, como discurso de ódio, fake news e fraudes.
No entanto, a decisão foi recebida como uma tentativa de censura. Rapidamente, jovens se organizaram nas ruas com o slogan: “Bloqueiem a corrupção, não as redes sociais”.
Segundo a TV estatal do Nepal, no primeiro dia de manifestações, a polícia abriu fogo contra a multidão em frente ao Parlamento, deixando 19 mortos e mais de 100 feridos. A repressão policial serviu de combustível para que a revolta ganhasse ainda mais força.
Escalada da violência: renúncia e caos
Na terça-feira (9), a crise atingiu seu auge. Pressionado, o primeiro-ministro KP Sharma Oli anunciou sua renúncia, afirmando que a decisão buscava “dar novos passos em direção a uma solução política”.
Mas a renúncia não acalmou os ânimos. Manifestantes invadiram o Parlamento, incendiaram o prédio do Legislativo, casas de ministros, o Supremo Tribunal e até hotéis internacionais como o Hilton. O aeroporto de Katmandu foi fechado por causa da fumaça e da destruição causada.
Imagens divulgadas pela agência Reuters mostram civis armados com rifles de assalto circulando pelas ruas da capital, enquanto ambulâncias e veículos de segurança eram atacados.
Leia também: Ataque russo deixa mais de 20 mortos em aldeia no leste da Ucrânia e aumenta clima de tensão global
Exército assume controle e toque de recolher
Diante do colapso da segurança, o Exército do Nepal anunciou que assumirá a lei e a ordem a partir das 22h do horário local (13h de Brasília). Um toque de recolher foi decretado em pontos estratégicos de Katmandu, incluindo o gabinete do premiê e a residência do presidente.
O Ministério da Saúde pediu à população que doe sangue para ajudar no atendimento aos feridos, em meio ao sistema hospitalar sobrecarregado.
Crise social e política
Segundo a Reuters, o presidente Ram Chandra Paudel aceitou a renúncia de Oli e já iniciou conversas para escolher um novo premiê. Entretanto, analistas afirmam que o problema vai além da troca de líderes.
O Nepal, país com cerca de 30 milhões de habitantes, enfrenta alta taxa de desemprego, corrupção e forte instabilidade política. Milhões de nepaleses vivem fora do país, principalmente no Oriente Médio, Coreia do Sul e Malásia, enviando remessas de dinheiro para sustentar suas famílias.
Especialistas comparam a atual onda de protestos à Primavera Árabe de 2011, quando populações em diversos países derrubaram governos autoritários após anos de frustração social e econômica.
O que esperar?
O Nepal vive um momento decisivo: se os protestos conseguirem pressionar por reformas políticas e mais liberdade, o país pode entrar em um novo ciclo democrático. Por outro lado, há riscos de guerra civil, aumento da repressão militar e aprofundamento da crise econômica.
Enquanto isso, a população segue dividida entre a esperança de mudanças e o medo de mergulhar em um período ainda mais instável.
Fontes: The New York Times, Reuters, AFP, UOL, G1