Dia da Favela e um Brasil que não celebra a força do seu povo

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Cris do Morro

O Dia da Favela celebra não apenas uma data, mas a resistência de milhões de brasileiros que constroem suas vidas nas comunidades. Em um país marcado pela desigualdade social, as favelas representam muito mais que estatísticas: são territórios de cultura, força e potência criativa. Do Aglomerado da Serra, em Belo Horizonte, às comunidades do Rio de Janeiro, essas vozes ecoam através de iniciativas como a Rádio Favela, provando que é possível transformar realidades apesar dos desafios diários.

A importância de amplificar a voz de quem vem de um espaço que sempre foi invisibilizado

O Aglomerado da Serra é a maior favela de Belo Horizonte. Estima-se que mais de 50 mil pessoas vivam na comunidade. Alguns projetos do Aglomerado da Serra se destacam, como por exemplo a Rádio Favela, que transmite programas direto do morro. Com o intuito de ser uma rádio educativa, de divulgar a cultura negra e denunciar os problemas enfrentados pelos moradores da comunidade, a Rádio Favela é um exemplo de veículo jornalístico que, de fato, cumpre o papel social no qual sempre teve a intenção de ter.

O Brasil é um país desigual em sua essência e principalmente em sua história, e as favelas representam isso. Elas surgiram no início do século XX, com a migração dos trabalhadores do campo para as cidades. Muitos indivíduos se mudaram para as regiões em constante industrialização em busca de emprego e se estabeleceram em áreas sem infraestrutura. As favelas então, representam um símbolo da exclusão social no país, invisibilizada e carente por políticas públicas durante toda a sua história. 

Projetos sociais

Para além de dar visibilidade aos problemas sociais que necessitam de investimento governamental, o Dia da Favela não celebra a desigualdade, mas sim a força de uma comunidade ativa e consciente da sua importância e do que necessita. Os projetos sociais, por exemplo, fomentam a cultura e o desenvolvimento econômico e social na comunidade, chamando a atenção do poder público para que haja investimento em uma região cheia de pessoas que têm vontade de crescer.

Dia da Favela - Misael Avelino, fundador e coordenador da Rádio Favela

Misael Avelino, fundador e coordenador da Rádio Favela (FM 106.7)

A vida em um cenário de violência 

É preciso reconhecer também os desafios presentes nas favelas, os quais ameaçam os direitos básicos dos moradores e, por isso, necessitam de alternativas eficazes. A violência nas favelas de todo o Brasil ameaça a saúde, a educação, o bem-estar e a vida dos milhões de moradores dessas comunidades. 

O crime organizado e a violência policial são fatores que geram medo em todos os indivíduos residentes nas favelas, inclusive naqueles que não possuem qualquer relação com a “guerra” que envolve as facções. Um estudo realizado  pela ONG Redes da Maré, com parceria da Universidade Federal do Rio de Janeiro e de duas universidades no Reino Unido, analisou os impactos da violência armada na vida de 59 mulheres do Complexo da Maré. 

Apesar dos homens negros serem os principais alvos nos conflitos armados, a pesquisa apresenta o sofrimento das mulheres que, muitas vezes, têm suas casas invadidas e sofrem abuso moral ou sexual, além de várias perderem seus filhos durante as operações. Com isso, muitas dessas mulheres estão em situação de vulnerabilidade, correndo o risco de adquirirem danos à saúde física e mental. 

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Investimentos públicos nos últimos 35 anos 

Um estudo realizado pelo instituto MapBiomas analisou o crescimento das favelas no Brasil nos últimos 35 anos. A pesquisa comprovou que o número dessas comunidades aumentou o equivalente a 11 cidades de Lisboa, em Portugal, que possui uma área de 100km². 

Apesar de ser motivo de orgulho para os moradores e merecer reconhecimento nacional de sua potência, é preciso que, acima de tudo, todos compreendam as necessidades de quem habita nesses espaços. Em 2012, o IBGE mostrou que entre os anos de 2010 e 2019, o número de favelas dobrou no Brasil, revelando um alerta para o aumento da desigualdade no país.

As comunidades se caracterizam, muitas vezes, pela falta de saneamento básico, exposição à violência, insegurança alimentar e entre outros fatores que nos mostram que os direitos básicos, infelizmente, não chegam a todos. Apesar de o programa “Minha Casa, Minha Vida” ter construído por volta de cinco milhões de moradias entre 2009 e 2018, a favelização continuou em crescimento, principalmente pelo aumento do desemprego. 

Preconceito e romantização 

A falta de oportunidades de emprego e estudo fazem os moradores das favelas parecerem “inaptos” a modificarem suas realidades. É preciso que todos os indivíduos que têm a intenção de auxiliar na construção de uma sociedade mais justa se manifestem contrários aos estereótipos e preconceitos aplicados à quem veio do morro. 

Mas, é necessário encontrar um meio termo. Em meio ao grande acesso à informações, muitas vezes de maneira equivocada, as quais reforçam os estereótipos relacionados à favela, não devemos apelar para a romantização da realidade daquelas pessoas. Uma vez que o jornalismo não expoẽ as dificuldades enfrentadas por aqueles que vivem na realidade das favelas, a tendência de quem não está inserido no ambiente é considerar que as comunidades são apenas como uma realidade idealizada, composta apenas por diversão e cultura, onde se anula assuntos que também são de interesse do público.  

Autores: Larissa Gino e Cristiano Silva

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